domingo, 15 de julho de 2018

camisolinhas de tricot

“Nem se trata bem de uma cunha. De certa forma é até mais interessante, porque demonstra como esta classe pensa que tudo lhes é devido. Os ricos faziam camisolinhas de tricot para os pobres e, em troca, a Igreja dava-lhes, como hoje se diria, a sua base de dados *. ...
Em Portugal, para se enriquecer nem sempre é preciso faro empresarial, inteligência ou trabalho. Basta conhecer alguém no governo, nos partidos e, agora menos, na igreja. ... [J]ulgo saber que [as PPP] foram criadas por Executivos em vésperas de eleições, envolvendo contratos favoráveis aos privados e lesivos dos contribuintes. Se não acreditam entretenham-se a ler  os relatórios da Comissão do Mercado de Valores Imobiliários. Em muitos casos, a passagem pelo governo é apenas uma plataforma para se chegar a melhor lugar. ...
Como veremos, esta forma de se obterem vantagens não é diferente do que acontecia com o velho contrato do tabaco. ... A importância do contrato demonstra a fraqueza do capitalismo nacional:  não era por fábricas, por minas ou companhias de navegação que os portugueses do século passado se interessavam, mas por um sector arcaico e dependente do Estado. O processo das PPP tem muitas semelhanças: de facto, é o Estado quem escolhe, de entre os ricos, quem se tornará milionários.

* [nota 62] Eis o que a carta da marquesa da Foz contém no final: ‘Mando pelo mesmo portador 2 xailes feitos à mão por mim com lã da melhor para presentear duas doentes que sejam asseadas pois podem durar vários anos. Isto tem pouca importância mas fi-los com sacrifício e claro que é mais para Deus, mas seria uma pena dar a uma desmazelada.´ “

Os Ricos, Maria Filomena Mónica, a esfera dos livros, 2018, pp. 54-55

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