quinta-feira, 6 de março de 2025

josé antónio saraiva

Não sou dado a obituários, mas vou abrir uma muito rara excepção para assinalar a memória de José António Saraiva, autor de “Eu e os políticos”, um livro que foi proibido depois do 25 de abril.*

Ao longo dos próximos dias e a começar hoje, reproduzirei aqui um conjunto de notas de leitura que mais oportunamente aqui fiz a pretexto desse livro censurado pelo regime democrático. Começo com a nota de leitura que incide no epílogo desse livro.

_________

*tentei verificar se teria sido o único, mas acabei por desistir. O motor de busca insiste em corrigir a busca para “livros proibidos durante o Estado Novo”.


p. 262 (notas de leitura)

No curto epílogo de “Eu e os políticos”, o autor declara que a sua “…única ambição … foi deixar um testemunho que possa ser útil a quem, no futuro, tente reconstituir a história deste período.”

E, mais à frente, acrescenta: “Só guardei para mim aqueles segredos cujo interesse público, em meu entender, não mereceria os danos que a sua divulgação poderia causar.”

Como escrevi antes, ficou-me a suspeita de que o autor deixa muitas coisas por contar – e essa suspeita foi grande ao longo da leitura das páginas dedicadas ao trampolineiro ** e das personagens que o rodeavam. De onde não esteja absolutamente certo da justeza do critério do autor na omissão de “segredos”. Não por desonestidade porque me parece estruturalmente honesto e incapaz da mentira. Mas porque confirmei a impressão que já tinha antes de ler o livro: Saraiva padece de uma quase surreal candura e muito ou tudo do que se lhe atribuiu de maledicência não é mais do que um dos efeitos dessa candura. Mas até por causa dela, a anunciada ambição do autor parece-me perfeitamente conseguida.
Não é um livro “de mexericos” e não merecia toda a série de deselegâncias com que foi acolhido. É um documento escrito por alguém que, por força da sua profissão, privou com muitos dos protagonistas políticos do regime democrático.

_________________

** Com “trampolineiro” referia-me ao senhor engenheiro sócrates, um político de que muitos dos nossos compatriotas ainda guardam muita saudade.

Sem comentários:

Enviar um comentário