quarta-feira, 17 de abril de 2019

de como a geringonça é muito bem capaz de se estraçalhar naquilo de que se julgava dona e senhora

Não será já amanhã. Mas cheira-me que um grupo de motoristas de pesados se descobriu dono de um poder negocial que nem para estivadores ainda é o que já foi: o poder de paralisar completamente o país.
Percebeu, por exemplo, que alguns membros da família, designados para administrarem os transportes por caminho-de-ferro, recrearam-se a vender os carris a um sucateiro contra o pagamento simbólico de umas caixas de robalos (“Pimenta no cú dos outros é refresco”, era a ilustre divisa do rapazola…). Percebeu que excluídas as zonas de residência da família, por todo o resto do país os autocarros caem aos pedaços, têm a eficiência dos transportes públicos da República da Moldávia, são escassos e quando os há são caros, muito mais caros e inviáveis que o transporte particular. Percebeu que fora das zonas de residência da família, sem gás que venha em garrafa, a vida é pouco prática na hora de cozinhar ou tomar banho. Percebeu que os carros a pilhas são caros e só a família e pessoas muito “à frente” os podem comprar. Percebeu, enfim, um ror de coisas que não são muito complicadas de perceber.
Mas a mais fina certeza de que se compreendeu em poder- com patrões e família trazidos à aborrecida adversidade de terem de ouvir trabalhadores a quem, faz poucos dias, condescenderam pagar 630 € mensais e meia dúzia de missangas em contrato coletivo -, é o facto de estarem em greve porque exigem ser pagos nem mais nem menos que pelo dobro desse valor.
Ora, tudo isto leva-me a suspeitar que a esquerda, em tempos dona e senhora da rua, aburguesou-se entretanto. E nesse processo deu de se achar dona da rua e… do poder. Esta cómica suspeita assenta nalguns acontecimentos patuscos:
Em setembro do ano passado, o contrato de trabalho coletivo agora em causa foi assinado entre patrões e uma federação de sindicatos dos transportes e comunicações afeta à CGTP. Isto apesar de por alturas da assinatura desse contrato coletivo já existir um sindicato específico dos motoristas de matérias perigosas.
Os primos que fazem de ministros do trabalho, ambiente e mais-não-sei-quê (uma cena que a família inventou para mamar a valer no imposto sobre o gasóleo) decidem estabelecer um conjunto de serviços mínimos: hospitais, bombeiros (uma boa meia dúzia de coisas pacíficas…),  e postos de abastecimento nas zonas urbanas em que a família se serve.
Na terça, a família reunida em conselho extraordinário decretou a “requisição civil” a pretexto de que os serviços mínimos não foram cumpridos (o sindicato afirma que os motoristas prestaram serviços de transporte a hospitais, lares e instituições semelhantes. Aparentemente ficaram de providenciar transporte de combustíveis para as áreas de residência da família, coisa que os motoristas imaginam ser um pouco exagerado considerar “serviço mínimo”…).
Portanto, fica mais ou menos provado que esta gente do tal sindicato independente tem mau feitio e não é açaimável pelo comité do camarada Jerónimo, à boa maneira socialista.
Reparar a traquitana nestes desapertos, sobretudo agora que precisava embalar para as europeias, parece-me que só por expediente legislativo, alargando o número dos encartados habilitados para o transporte de matérias perigosas. Por exemplo, eu que estou legalmente habilitado a montar uma hayabusa, passava a poder conduzir também um camião cisterna com ácido sulfúrico. É certo que uma hayabusa só tem duas rodas, mas também não deixa de ser muito perigosa.
O único problema é que com estas coisas da CEE, os gajos lá na Europa se calhar não deixam.

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